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Beber um café em Portugal provoca a desflorestação de outros países

Um novo estudo aponta para a continuação da desflorestação e da degradação florestal impulsionada pelas importações dos países da União Europeia (UE). Portugal não é excepção: o consumo do País coloca em risco mais de 2 700 hectares de floresta por ano. Reconhecendo a importância de uma acção concertada e consequente, a ANP|WWF, a DECO, a TROCA e a ZERO juntam-se no apoio à implementação do novo regulamento anti-desflorestação.

Em comunicado conjunto, é divulgado que “mais de 90% da desflorestação global é causada pela expansão agrícola para produzir um número reduzido de produtos que se tornaram mercadorias globais, entre elas bovinos, cacau, café, óleo de palma, borracha, soja, milho e madeira.” No âmbito deste cenário, a Comissão Europeia perpsectiva que “as importações para o consumo na UE contribuem para cerca de 10% da desflorestação mundial, que está estimada em mais de dois mil milhões de hectares por ano.” A este ritmo, referem as entidades conjuntas, “poderá contribuir para a destruição de cerca de 248 mil hectares (ha) de florestas por ano, até 20304.”

Recorde-se que entre 2015 e 2020 perdeu-se, em cada ano, uma área florestal maior que Portugal.

O comunicado foca um novo estudo, desenvolvido pelo Trase, que confirma a existência de um elevado impacte negativo do consumo dos países da UE nas florestas: “estima-se que o risco de desflorestação associado às importações e exportações de mercadorias agropecuárias seja cerca de 190 500 ha por ano (média do período 2019-2021), o que corresponde a 19% da desflorestação tropical incorporada nas importações dos principais produtos agropecuários. Em Portugal, o risco de desflorestação associada ao consumo é superior a 2 700 ha anuais.”

De acordo com a informação avançada, “a maior parte da desflorestação associada às importações de Portugal tem origem no Brasil (35%)”, sendo que “as importações de Portugal poderão contribuir para 950 ha de desflorestação, por ano, no Brasil, com a maior fatia a corresponder à importação de soja destinada sobretudo à alimentação animal.”

DR Foto: Finde Zukunft na Unsplash

Tudo está interligado: “A importação feita pelo nosso país de couros e peles de bovinos para a transformação e produção de calçado e assentos poderá estar ligada à expansão da pecuária na Amazónia”. Se a esta realidade acrescentarmos a biomas, como as Pampas e o Cerrado, o impacte das exportações para Portugal na degradação de ecossistemas no Brasil ultrapassa os 1 500 ha7.” A esta destruição destes ecossistemas está igualmente “ligada à usurpação de terras a povos indígenas e comunidades locais, podendo envolver formas de exploração laboral.” Aliás, como o estudo foca: “O café que consumimos é o produto mais ligado à desflorestação entre as importações de Portugal”, representando “23,8% de toda a desflorestação associada às importações do país em 2019-2021, sobretudo na Costa do Marfim, na República Democrática do Congo e no Vietname.”

O comunicado termina com um alerta: “Cada português(a) poderá estar a contribuir, anualmente, para mais de 60 ha de desflorestação pelo consumo de café, estando Portugal entre os cinco países com maior exposição per capita. No entanto, esta desflorestação é invisível para o consumidor, não existindo informação disponível para que possa tomar uma decisão informada.”

Refira-se, no entanto, que, a partir de 2025, os importadores terão de evidenciar que os produtos importados não estão ligados à desflorestação.

Recorde-se que o Regulamento Europeu para Produtos Livres de Desflorestação (EUDR) entrou em vigor em 2023 com o objectivo de impedir a entrada e saída do mercado da UE a produtos ligados à desflorestação. Desta forma, pretende dar um contributo decisivo para chegar à meta de zero desflorestação até 2030.

Em 2025, as grandes empresas, que colocam produtos de risco no mercado da UE, já estarão sujeitas a obrigações de diligência devida, trazendo mais transparência às cadeias de abastecimento. Entretanto, alguns países e Estados-membros do Parlamento Europeu têm colocado reservas à aplicação do regulamento, conforme refere o comunicado.

Por isso, as entidades envolvidas no presente comunicado sublinham que “adiar a aplicação do EUDR representa riscos significativos, incluindo a contínua degradação ambiental, perda de biodiversidade e aumento das emissões de gases de efeito estufa.” Além disso, na sua opinião, “este adiamento pode gerar incertezas no mercado e enfraquecer os esforços internacionais para combater a desflorestação, diminuindo a liderança da UE na governança ambiental global.”

Por isso, defende que se deve “apoiar a implementação imediata do EUDR” que consideram ser “crucial para proteger ecossistemas vulneráveis, promover práticas comerciais sustentáveis e fortalecer a cadeia de abastecimento global.”

Por outras palavras, “é imperativo que os países da UE apoiem o EUDR sem atrasos para salvaguardar a integridade ambiental e mitigar as alterações climáticas” e é importante a “cooperação entre as autoridades competentes dos Estados-membros” e “um envolvimento activo da sociedade civil.”

DR Foto: PROJETO CAFÉ GATO-MOURISCO na Unsplash