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Avaliação Ambiental Estratégia é “falsa”?

As organizações portuguesas de defesa do ambiente SPEA, Almargem, ANP|WWF, A Rocha, FAPAS, GEOTA, LPN e ZERO, com o apoio da ONG internacional de direito ambiental ClientEarth, consideam que sim e por isso levaram o Governo português a tribunal para travar o projecto de construção do Aeroporto do Montijo. As mesmas anunciam que vão apresentar à acção judicial, que corre no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, a posição sobre a inutilidade e ilegalidade da Avaliação Ambiental Estratégica, nos moldes como está prevista pelo Governo.

Em comunicados, estas associações consideram que o concurso público para a realização da Avaliação Ambiental Estratégica e a própria AAE são ilegais e em nada poderão alterar os fundamentos da acção administrativa por não ser uma verdadeira AAE e não realizar um verdadeiro estudo das alternativas.

O Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT) foi recentemente autorizado a assumir encargos plurianuais para comissionar uma Avaliação Ambiental Estratégica sobre a solução aeroportuária para a região de Lisboa, ficando com o dever de avaliação e controlo decorrentes do procedimento até ao seu termo. No entanto, conforme informação que consta no caderno de encargos do concurso, o Governo determinou que o estudo deve comparar apenas três soluções: Lisboa + Montijo, Montijo + Lisboa, e Alcochete. Esta decisão prévia de limitar as alternativas sem considerar outras visões estratégicas de futuro e perspectivas de desenvolvimento, que deviam ser definidas durante a elaboração da AAE e não a priori, inquina o processo e retira-lhe o carácter de AAE. Soma-se a isto o fato de que duas das soluções dizem respeito à utilização da Base Aérea N.º 6 no Montijo, localização considerada inviável do ponto de vista ambiental e pouco estratégica por não permitir integração com o modal ferroviário.

Considerando o rumo dos acontecimentos recentes, desde a Declaração de Impacto Ambiental baseada num Estudo de Impacto Ambiental incompleto, imponderado e enviesado, tendo ainda o Ministério Público concluído pela sua invalidade, até ao anúncio da Avaliação Ambiental Estratégica limitada a priori no seu âmbito e objectivo, estas organizações portuguesas de defesa do ambiente comunicam agora ao Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, a informação de que o Governo anunciou o concurso público para a realização de uma avaliação condicionada e limitada e, portanto ilegal, que em nada poderá alterar os fundamentos da acção administrativa, visto não ser uma verdadeira AAE e não realizar um verdadeiro estudo das alternativas, concluindo numa avaliação que, independentemente do seu resultado, será ilegítima. Ou seja, gasta-se dinheiro público (2,5 milhões de euros) numa pseudo-avaliação que no final não servirá para indicar a melhor alternativa.

Para se ter uma ideia das questões verdadeiras e falsas que andam em torno desta questão as associações avançam com um quadro que esclarece quaisquer dúvidas:

1 – O aeroporto só pode ser construído em uma das localidades definidas: Montijo (principal ou complementar) ou Alcochete. FALSO. Anteriormente a estas soluções apresentadas, já foram estudadas pelo menos outras 17 opções. Porém, muitas delas foram analisadas em um outro contexto histórico, com outras premissas e critérios que certamente diferem dos que deveriam ser tomados em conta no ano de 2021. No entanto, não se sabe exactamente quais os critérios e interesses levaram o governo a restringir a AAE para estas três actuais soluções. Para além das questões ambientais, a definição do local deve primeiro considerar que infra-estruturas aeroportuárias o país precisa. Precisamos de um aeroporto temporário? Precisamos de um definitivo? De que dimensão? Questões que deveriam ser amplamente discutidas com a sociedade.

2 – “Decisões perfeitas não existem, mas mesmo assim temos de decidir”, in ministro das Infra-estruturas e Habitação, Pedro Nuno Santos. VERDADEIRO, MAS… É realmente difícil encontrar soluções perfeitas, mas torna-se mais difícil encontrar boas soluções quando se limitam as possibilidades num momento de avaliação estratégica. Do ponto de vista ambiental, todo projecto de infra-estrutura terá algum impacto. No entanto, é importante ter em conta que alguns impactos ambientais podem ser reduzidos, mitigados ou irreversíveis. Portanto, é essencial que a preocupação ambiental faça parte das decisões políticas da mesma forma como a preocupação económica, sendo consideradas desde o início do processo de elaboração dos planos e programas governamentais e não ser apenas mais um requisito a ser cumprido depois das decisões serem tomadas.

3 – A Avaliação Ambiental Estratégica vai apresentar a melhor solução para o novo aeroporto. FALSO. A AAE que o governo quer realizar vai apenas apontar qual solução tem menor impacto ambiental dentre as três opções definidas previamente. A melhor solução, tanto do ponto de vista da sustentabilidade ambiental, quanto económica, de segurança para a população, e que responde às necessidades do país, pode nem estar a ser considerada. Um aeroporto no Montijo comprometeria uma das mais importantes zonas húmidas da Europa, o estuário do Tejo, colocando em risco aves migratórias e ecossistemas sensíveis, além de ser uma área com susceptibilidade elevada a sismos, inundações e até tsunamis. Também a qualidade de vida das populações humanas não está a ser devidamente considerada com as três opções da AAE.

4 – Se a opção Montijo chumbar, não há plano B. (ThierryLigonnière, CEO da ANA-Aeroportos de Portugal – https://sol.sapo.pt/artigo/752862/montijo-novo-aeroporto-cada-vez-mais-sem-alternativa). FALSO. A opção de um aeroporto no Montijo é defendida pela concessionária por já terem desenvolvido o projecto e o estudo de impacto, e, portanto, demoraria mais no caso de ter de ser desenvolvido novo projecto e EIA, além de que seria mais caro. No entanto, importa ressalvar que um novo aeroporto terá impactos de longo prazo, não só ambientais como também na vida da população, e portanto é mais importante fazer a escolha certa do que a mais rápida e barata.

5 – É preciso pensar numa nova solução aeroportuária para Lisboa. VERDADEIRO. A localização actual do aeroporto expõe a população de Lisboa a níveis elevados de poluição do ar e um excesso de ruídos do tráfego aéreo e do tráfego rodoviário gerado pelo aeroporto, ultrapassando muitas vezes os limites permitidos pela OMS inclusive durante a noite. No entanto, construir um novo aeroporto em áreas ambientalmente sensíveis, ou próximo a outras concentrações urbanas, tampouco resolve o problema. É preciso repensar o modelo de desenvolvimento que os portugueses querem e de que maneira o turismo e a expansão dos transportes aéreos se encaixam (ou não) em suas prioridades, sem colocar em risco a saúde das pessoas e do planeta.